Aprofundamento da Democracia – Documento de Conclusões Preliminares.

CICLO DE REFLEXÕES E DEBATES RELATIVOS AO TEMA

APROFUNDAMENTO DA DEMOCRACIA

LEVADOS A CABO DURANTE OS MESES DE ABRIL E MAIO DE 2011 PELA

ASSOCIAÇÃO 25 DE ABRIL (A25A)

E O

MOVIMENTO 12 DE MARÇO (M12M)

A – PREÂMBULO

a) Convictos da actualidade e importância dos valores e dos princípios inscritos na Constituição Portuguesa emanada do 25 de Abril;

b) Considerando que a actual crise global, resultante de um modelo de organização económica afastado dos interesses das pessoas, poderá tornar insustentável a manutenção do modo de vida actual dos povos Europeus, designadamente quanto ao emprego e aos instrumentos de segurança social e à promoção da igualdade;

c) Preocupados com o potencial aumento da crispação e conflitualidade social e com um eventual endurecimento da acção dos Estados, tendendo ao uso da repressão e à adopção de atitudes e procedimentos autoritários;

d) Preocupados com a tendência para a supressão dos direitos, liberdades e garantias salvaguardados na Constituição da República Portuguesa e com os ensaios já ocorridos no sentido da sua alteração em nome do modelo imposto pelo FMI/BCE/UE, o que, a acontecer, constituiria uma inaceitável ruptura com o pacto constitucional que une os portugueses desde 1976;

e) Preocupados com os elevados níveis que a corrupção atingiu no nosso país.

A Associação 25 de Abril e o Movimento 12 de Março estão a promover um ciclo de reflexões e debates de que resulta, desde já, o presente documento preliminar.

B – PROCESSO

O presente documento de Conclusões Preliminares teve como base:

a) A intervenção do Presidente da Associação 25 de Abril no discurso de encerramento do desfile popular comemorativo do 37º aniversário da Revolução de Abril de 1974.

b) As preocupações que motivaram o “Protesto da Geração à Rasca”, a 12 de Março de 2011, e as dinâmicas e posições tomadas na sua sequência, designadamente pelo Movimento 12 de Março.

c) Os debates e reflexões levados a efeito no âmbito da cooperação entre a A25A e o M12M, designadamente no ciclo subordinado ao tema “Aprofundamento da Democracia”, com a participação de convidados e muitas outras pessoas intervenientes nas suas três sessões já realizadas.

d) As sugestões registadas por diversas pessoas, nomeadamente nas redes sociais da internet associadas à organização do ciclo de debates.

C – CONCLUSÕES PRELIMINARES

1. MODELO DEMOCRÁTICO INSTITUCIONAL: SEUS BLOQUEAMENTOS E MODELOS ALTERNATIVOS

a) O modelo democrático consignado na Constituição da República constitui uma conquista do Povo Português que reflecte os objectivos da Revolução de Abril e continua a conter as potencialidades necessárias para a superação da grave crise nacional que Portugal hoje atravessa.

b) As insuficiências e perversões que a Democracia portuguesa manifesta não resultaram do modelo constitucional mas da forma sistematicamente parcelar e viciada com que os numerosos órgãos e agentes políticos têm interpretado e cumprido os seus deveres constitucionais, aproveitando-se da fraca vigilância e da reduzida participação de todos nós.

c) A Democracia tem de começar por se praticar dentro dos partidos políticos. Se não há Democracia sem partidos, também não pode haver partidos sem Democracia!

Os partidos têm de se reaproximar das suas bases sociais e das suas militâncias de base. Têm de recuperar as suas funções de pedagogia e mobilização social, abandonando o actual posicionamento de lobbies para conquista do poder sem olhar a meios para alcançar esse desiderato.

d) Por razões conjunturais, a Revolução de Abril conferiu aos partidos políticos o monopólio da representação popular. A nossa Democracia tem que ser capaz de estender essa capacidade representativa a outros grupos da sociedade.

e) O aparelho do Estado foi partidarizado, tornou-se palco de interesses particulares e de práticas predatórias que o enfraqueceram funcional e financeiramente, constituindo hoje mais uma plataforma de acção de grupos específicos de interesses do que o instrumento da realização dos interesses colectivos da sociedade.

f) O Poder Judicial, peça essencial do estado de direito democrático, padece de mazelas funcionais e de orientação resultantes do seu condicionamento por poderes corporativos, particulares, partidários ou económico-financeiros ilegítimos e discriminatórios. Afastou-se da sua condição de órgão de soberania independente, desprestigiou-se e enfraqueceu-se a si próprio e à Democracia, exigindo-se a sua efectiva subordinação à vontade soberana popular.

g) A Democracia portuguesa não pode reduzir-se aos vários actos eleitorais periódicos. As estruturas de poder daí resultantes não podem ignorar os objectivos e conteúdos constitucionais, não podem deixar de cumprir os programas que estiveram na base  da sua escolha pelos eleitores, não podem deixar de prestar contas. Têm de deixar de estar ao serviço de interesses particulares, corporativos e económico-financeiros, nacionais e internacionais, têm de deixar de ser pasto da corrupção.

Os objectivos constitucionais têm de sobrepor-se aos mecanismos formais da Democracia representativa. O conteúdo tem de ser mais importante do que a forma.

h) Por outro lado, as componentes participativas da Democracia, que à luz da Constituição da República deveriam ter sido estimuladas e fomentadas, viram-se sucessivamente inibidas não só pelas exageradas exigências administrativas impostas mas também pelas práticas políticas prosseguidas pelos órgãos do poder, desde a simples participação ao nível das decisões locais até aos casos de transferência de poderes de soberania para instâncias supra-nacionais.

i) Como resultado de processos de decisão nacional viciados na forma e no conteúdo, de estratégias ocultas e insustentáveis e do continuado mascaramento da real situação perante o povo, Portugal foi conduzido a uma grave crise nacional. Como consequência, recorreu-se ao capital financeiro internacional, dele ficando refém, sem perspectivas produtivas que permitam o seu pagamento sem recurso a sucessivos empréstimos. Essa espiral de endividamento é fortemente injusta e insuportável para a grande maioria das pessoas e põe em causa o futuro das camadas mais jovens.

j) A Democracia portuguesa está extraordinariamente desequilibrada: a distribuição da riqueza produzida beneficia escandalosamente o capital em detrimento do trabalho.

k) A superação das limitações e perversões democráticas actualmente existentes só será possível através de uma ampla e intensa reivindicação social e cidadã, no pleno uso das liberdades e direitos constitucionais.

2. ACTIVISMO SOCIAL: LIMITAÇÕES, EXPERIÊNCIAS E EXIGÊNCIAS COMUNICACIONAIS

a) Os baixos rendimentos primários da população trabalhadora, a pressão patronal nos locais de trabalho, o extraordinário aumento da precariedade laboral e o forte aumento do desemprego são, a par da duração das jornadas de trabalho e dos longos tempos de deslocação diária entre os locais de residência e de trabalho, poderosos meios de inibição da participação e intervenção da população trabalhadora nas actividades cívicas e sindicais, sobretudo dos mais frágeis e, em particular, das mulheres.

b) A cultura cívica da sociedade portuguesa está ainda muito refém dos 48 anos de ditadura autoritária e de outras forças que hoje continuam a promover a desresponsabilização do indivíduo face ao que é colectivo (a rua, a cidade ou o país), o individualismo, o atavismo, o conformismo, a fraca cultura de participação cívica e uma certa visão sebastiânica, que tendem ao afastamento da população portuguesa da política. O vazio que fica em resultado disso, é usurpado e ocupado pelos poderes (politico, económico e outros), que se estabelecem e eternizam, bem como os seus dogmas e protagonistas.

c) O modelo sócio-económico redistributivo associado ao controlo público pelos interesses partidários e particulares, geraram um sistema de dependências financeiras das organizações sociais autónomas em relação aos poderes dominantes, reduzindo fortemente a sua independência tendendo a transmutá-las de estruturas libertadoras da sociedade civil e de iniciativa cidadã em estruturas de condicionamento e submissão social face a esses interesses dominantes.

d) Uma cultura de rivalidade e de “pequenas quintas”, fomentada pela ideologia dominante e os mecanismos de dependência, tem criado obstáculos à modernização funcional e a cooperação entre as mais diversas organizações sociais na perspectiva da potenciação das suas capacidades de acção, da melhor defesa dos interesses gerais da população e da mobilização desta para a iniciativa e a intervenção cívica.

e) A comunicação social em geral, mesmo a pública, dá pouca voz às dinâmicas sociais autónomas, não reflecte a diversidade plural da sociedade, as suas realizações e expectativas, não torna visíveis os invisibilizados pelo sistema e não constitui um factor de mobilização cívica. Contrariamente, dá voz aos interesses de grupo, partidários ou do mercado, comprometendo a sua função de serviço público e de elemento essencial para a formação de uma opinião pública crítica, informada e plural.

f) Apesar da legislação consagrar instrumentos que visam garantir a independência dos profissionais da comunicação social e a sua participação na definição das políticas editoriais, a precariedade laboral e as pressões económicas têm, globalmente, neutralizado tais instrumentos e impondo, em seu lugar, mecanismos de submissão.

g) Continuam no entanto, a subsistir estruturas de comunicação social onde a multiplicidade dos interesses da sociedade pode encontrar eco, constituindo-se assim como trincheira comunicacional aberta e plural, que se opõe à manipulação e ao conformismo social, como plataforma de pedagogia democrática e de iniciativa cidadã.

h) As redes sociais digitais, por serem estruturas não hierarquizadas, têm-se transformado em verdadeiros instrumentos de contrapoder democrático, na medida em que permitem a propagação em tempo real de ideias entre os que pertencem a uma mesma comunidade de interesses. Porém, a profusão do seu uso e a multiplicação de entradas dá origem a uma inundação de informação que torna difíceis leituras mais distantes e criticas dos fenómenos sociais. Importa desenvolver a literacia digital (literacia dos media) que desenvolva capacidades críticas perante a avalancha de conteúdos.

i) A potência das redes sociais é também fortemente determinada pela apropriação e pela reprodução que os media tradicionais fazem dos seus conteúdos, emprestando-lhes credibilidade e ligando entre si comunidades.

j) A superação das debilidades verificadas na autonomia e espírito de iniciativa da sociedade e dos seus instrumentos organizacionais e comunicacionais exigem um grande sentido de responsabilidade e de determinação cívica, aos níveis pessoal e colectivo.

D – PROPOSTAS DE ACÇÃO

Face às Conclusões Preliminares supra referidas, a Associação 25 de Abril e o Movimento 12 de Março decidem submeter a todas as pessoas e às suas organizações sociais as seguintes Propostas de Acção:

1. Dar a conhecer aos partidos políticos, às organizações sociais e às pessoas em geral as Conclusões Preliminares acima referidas;

2. Prosseguir o ciclo de reflexões e debates sobre o “Aprofundamento da Democracia”, cobrindo os domínios sociais, do sistema produtivo e da economia, da cultura e do conhecimento.

3. Exortar todas as organizações sociais, de carácter cívico, cultural, económico, sindical, profissional e de solidariedade social, desde as associações e comissões de moradores ou de interesses até às colectividades locais, suas estruturas coordenadoras ou federativas, associações juvenis e de estudantes, comissões de trabalhadores, universidades e comunidades de conhecimento, organizações políticas ou temáticas de âmbito nacional, a levarem a cabo processos de reflexão e debate colectivo sobre os seus interesses específicos e os assuntos de interesse geral e nacional, de que resultem conclusões e as correspondentes propostas de acção cívica para o aprofundamento da Democracia.

4. Promover encontros com e entre organizações sociais e as pessoas, com vista a estruturar um processo de solidariedade cidadã, de convergência de posições e de acções, no sentido da superação da actual crise nacional em benefício do povo português e do reforço da soberania nacional, com base nas seguintes ideias:

– Defesa das condições gerais de vida e trabalho de toda a população e, em especial, da população desfavorecida;

– Revitalização e aprofundamento da Democracia, com base na correcção das actuais limitações e desvios da Democracia representativa e da implantação extensiva de instrumentos de Democracia participativa.

– Resolução da falta de perspectivas futuras da população jovem, designadamente no âmbito de amplos programas públicos de economia social produtiva, envolvendo o Estado, as Autarquias, as Empresas, os Movimentos Sociais e o Sistema Financeiro;

– Desenvolvimento do Sistema Produtivo nacional com base no aproveitamento racional de todos os recursos naturais, humanos e tecnológicos disponíveis;

– Justa repartição dos custos financeiros e sociais da crise, incidindo principalmente nos sectores que mais beneficiaram com as políticas que a geraram;

– Combate efectivo e eficaz à corrupção;

– Reformulação da Justiça como pilar da Democracia,

– Reforço da auto-determinação cidadã e social, da mobilização popular, do espírito de iniciativa e da responsabilidade social;

5. Submeter ao debate político e social, como primeira contribuição não exaustiva, não exclusiva nem definitiva, as propostas constantes no ponto seguinte (E – Referências para um debate político e social alargado), de modo a formular um conjunto de medidas coerentes que, a serem prosseguidas pelos órgãos do poder, possam conduzir à mobilização do povo português para a saída da actual crise nacional.


E – REFERÊNCIAS PARA UM DEBATE POLÍTICO E SOCIAL ALARGADO

Com vista a encontrar um conjunto coerente de medidas que possam conduzir, com efectividade, ao aprofundamento da Democracia portuguesa, à retomada de confiança das pessoas nas suas instituições políticas e à sua mobilização cívica para a superação da actual crise nacional, propõe-se, como primeira contribuição para uma reflexão e debate alargado a toda a sociedade, o conjunto de medidas abaixo indicadas nos âmbitos do sistema político, da comunicação social e da cidadania.

1. Medidas no âmbito da defesa da soberania e do cumprimento da Constituição da República:

(1) No caso de a próxima alteração constitucional vir a ser forçada pelo acordo estabelecido com o FMI/BCE/UE, promover um referendo nacional prévio à sua entrada em vigor;

(2) Tornar obrigatório o referendo popular para quaisquer actos de política externa de que resulte transferência de soberania;

(3) Promover uma profunda reforma do Poder Judicial de modo a descorporativizá-lo e a fazê-lo subordinar directamente à soberania popular, através da eleição directa de cargos de topo da magistratura.

2. No âmbito do sistema político:

2.1 Dos Partidos políticos:

 

2.1.1 Exortar os Partidos Políticos e as respectivas militâncias a:

(4) Promoverem modos de funcionamento e eleição dos seus órgãos dirigentes de forma profundamente democrática e participada, bem como métodos de escolha de candidatos abertos à participação dos eleitores seus apoiantes;

(5) Assumirem um papel primordial de pedagogia e mobilização social democrática promovendo não só a luta e a conquista do poder mas, sobretudo, a reflexão e o debate de ideias com vista à resolução dos problemas da comunidade e do seu território;

(6) Assumirem a defesa dos interesses gerais da sociedade e defenderem-se contra a influência ilegítima de interesses particulares, corporativos e económico-financeiros, tanto ao nível das incompatibilidades funcionais dos seus membros como nos respectivos sistemas de financiamento.

2.1.2 Medidas de natureza legal:

(7) Reforço do regime jurídico dos partidos políticos e dos seus mecanismos de financiamento e transparência.

(8) Aprofundamento do regime de incompatibilidades, com efectivo período de nojo, para todos os titulares de cargos públicos.

 

2.2 Reforço dos instrumentos da Democracia representativa:

(9) Permitir a apresentação de candidaturas para todos os órgãos, nacionais, locais e europeus, a movimentos cívicos, em condições semelhantes às que existem para os partidos políticos.

(10) Introduzir em todas as eleições a opção que permita ao eleitor declarar não aceitar nenhum dos concorrentes.

(11) Libertar os deputados representantes dos eleitores aos níveis nacional, local e europeu de constrangimentos partidários e administrativos que colidam com a sua responsabilidade pessoal e directa perante o eleitorado das circunscrições que representam;

(12) Promover mecanismos de contratualização e consequente responsabilização legal dos programas de governo, em todos os níveis da administração, e a sua vinculação com os objectivos constitucionais nos mais diversos domínios;

(13) Aprovar leis e adoptar procedimentos eficazes contra a corrupção e o enriquecimento ilícito, a fraude e a evasão fiscais.

(14) Instituir instrumentos contínuos, periódicos e transparentes de prestação de contas de todos os órgãos de decisão política e dos titulares de cargos públicos de representação, fiscalização ou gestão.

(15) Instituir a figura e os mecanismos de revogação de todos os mandatos públicos, por iniciativa popular.

(16) Eliminar todas as pensões vitalícias pelo desempenho de cargos públicos electivos ou de nomeação e reduzir drasticamente todos os privilégios daí decorrentes que não se justifiquem pelo exercício estrito das respectivas funcionalidades, de acordo com o princípio de que “nenhum eleito ou titular de cargo público deve ser prejudicado ou beneficiado pelo exercício das suas funções”.

(17) Estabelecer a maior igualdade de tratamento (financeiro, de acesso à comunicação social, etc.), de todos os partidos e formações políticas concorrentes a eleições.

 

2.3 Reforço dos instrumentos de Democracia participativa

Promoção da instituição legal e prática de numerosos instrumentos de Democracia participativa, cruzando os vários níveis e âmbitos de decisão da administração pública e de socialização do aparelho do Estado, das empresas e instituições públicas autónomas.

(18) Criação de Conselhos Sociais junto de todos os Ministérios governamentais e pelouros de governação municipal, com a participação da cidadania, dos trabalhadores respectivos e das universidades, com importantes funções de parecer face aos instrumentos estratégicos de políticas públicas, de selecção dos quadros dirigentes da administração, de modernização processual, tecnológica e de controlo de gestão.

(19) Criação de Conselhos Sociais junto de todas as fundações e empresas públicas, estatais ou municipais, e das suas instituições autónomas, com a participação dos utentes dos respectivos serviços, dos trabalhadores respectivos e das universidades, com importantes funções de parecer face aos instrumentos estratégicos de políticas públicas, de selecção dos quadros dirigentes da administração, de modernização processual, tecnológica e de controlo de gestão.

(20) Instituição de Observatórios independentes, com forte participação da cidadania organizada, com direito de acesso a informação qualificada para monitorizar diversos aspectos relevantes da vida pública, social e económica.

(21) Instituir o referendo popular local e regional obrigatório para a aprovação de Planos Estratégicos de Desenvolvimento e outros assuntos relevantes.

(22) Abrir espaços de gestão social comunitária aos níveis de Freguesia e socialização das Juntas de Freguesia, tendendo a que estas deixem, a prazo, de fazer parte da administração pública estatal, com a concessão dos respectivos recursos e competências às respectivas comunidades auto-organizadas.

 

2.4 No âmbito da Comunicação Social

 

(23) Definição de um quadro de transparência e de isenção das tutelas dos órgãos de comunicação social que impeça o seu sequestro por entidades financeiras e grandes corporações empresariais, quer directamente quer por suas representadas.

(24) Exortar os órgãos de comunicação social a estabelecerem formas de articulação e de acção comum de modo a constituírem, pelos seus próprios meios e aproveitando as potencialidades da internet, uma vasta rede de suporte à difusão do pensamento livre e crítico e à mobilização e iniciativa social das pessoas e das comunidades.

(25) Exortar a classe dos profissionais da comunicação social ao espírito critico, à ética e ao cumprimento do seu código deontológico, resistindo à tendência para o “pensamento único” e para a manipulação da opinião pública, alinhando-se, pelo contrário, pelos genuínos interesses plurais das pessoas.

3. Referências relativas à Cidadania e às Organizações Sociais

3.1 Exortar a toda a Cidadania no sentido de:

(26) Cada pessoa exercer, por si própria e sem reservas, a Liberdade e os Direitos consignados na Constituição da República, e se assumir como um pólo de pensamento crítico, de resistência insubmissa a qualquer forma de opressão individual ou colectiva, de iniciativa cívica democrática, de solidariedade social e de auto-responsabilidade, tendo em vista a sua plena realização humana no quadro de uma sociedade plural, democrática e pacífica.

(27) Promover a máxima utilização dos instrumentos participativos já consignados na Constituição da República, como as petições, os referendos, as iniciativas legislativas de cidadãos e todas as outras formas de interpelação dos poderes instituídos, como os direitos de expressão, de manifestação e de associação.

(28) Apoiar as organizações associativas sociais já existentes, incluindo as sindicais, numa perspectiva inclusiva e socialmente eficiente, em função das necessidades reais das comunidades, e, sempre que necessário, constituir novas formas associativas, formais ou informais, para a resolução de problemas e necessidades actuais, incluindo económicas, numa perspectiva de autonomia e de iniciativa social.

3.2 Apelar às organizações sociais já existentes nos vários domínios da vida social, de carácter cultural e formativo, económicas, sindicais e profissionais e de solidariedade, no sentido de:

(29) Promoverem, com as respectivas comunidades, uma profunda reflexão sobre o seu papel transformador da sociedade e os constrangimentos que actualmente sentem, de modo a superá-los, a aumentar a respectiva autonomia e eficiência social, a modernizarem processos, formas de trabalho e a mobilizarem a iniciativa das pessoas e das comunidades onde se inserem.

(30) Desenvolverem formas de articulação cooperativa e federativa, sem excluir a união, que lhes permitam o máximo aproveitamento dos recursos disponíveis e das suas complementaridades, que permitam não só potenciar o desenvolvimento das comunidades numa perspectiva holística e integrada, como a sua capacidade de condicionamento dos poderes constituídos a favor das populações.

(31) Levarem a cabo, com os seus associados e as pessoas em geral, processos de reflexão e debate colectivo sobre os seus interesses específicos e os assuntos de interesse geral e nacional, de que resultem conclusões e as correspondentes propostas de acção cívica, designadamente no âmbito da superação da actual crise nacional

Agência Lusa comenta o documento da A25A e M12M sobre o “Aprofundamento da Democracia” – II

Democracia: Associação 25 de Abril defende “revogação de mandatos públicos por iniciativa popular” (C/ÁUDIO)

 

*** Serviço áudio disponível em www.lusa.pt ***

 

Lisboa, 03 jun (Lusa) – A Associação 25 de Abril e o Movimento 12 de Março defendem a “revogação de todos os mandatos públicos por iniciativa popular” e que os movimentos cívicos apresentem candidaturas “para todos os órgãos” em condições “semelhantes” às dos partidos.

As medidas constam de um documento que resultou de um ciclo de debates sobre o “aprofundamento da democracia”, que as duas organizações promoveram em abril e maio. O documento insiste sobretudo na necessidade de aumentar a participação política dos cidadãos.

Referindo-se à proposta de permitir que a iniciativa popular destitua mandatos públicos, Vasco Lourenço reconhece que “essa é uma medida controversa” mas sublinha que “melhoraria bastante a democracia”.

Para o capitão de Abril, “não pode ser por lana-caprina nem um pequeno grupo de cidadãos a tomar essa iniciativa” mas defende que “um cidadão eleito para determinado cargo” possa ser escrutinado pelos eleitores, “em número bastante significativo”, no sentido de “promover a sua substituição”.

No entanto, Vasco Lourenço salvaguarda, no entanto, que “essa medida, tal como todas as que estão no documento, está em aberto para discussão”.

A Associação 25 de Abril e o Movimento 12 de Março sugerem ainda que deve ser permitida a “apresentação de candidaturas para todos os órgãos nacionais, locais e europeus a movimentos cívicos, em condições semelhantes às que existem para os partidos”, bem como a instituição do “referendo popular local e regional obrigatório para a aprovação de planos estratégicos de desenvolvimento”.

As organizações defendem que, caso a próxima alteração constitucional venha a ser “forçada” pelo acordo com a troika (Fundo Monetário Europeu, Banco Central Europeu e Comissão Europeia), será necessário “um referendo nacional prévio”.

O capitão de Abril explica que “já se começaram a ouvir vozes [no sentido] de que as medidas do acordo são inconstitucionais”, pelo que “não é legítimo que uma maioria que saia destas eleições advogue que tem legitimidade para alterar a constituição forçada pelas medidas do acordo com a troika”.

Vasco Lourenço diz, no entanto, não acreditar que “o PS alinhe numa situação de alterar a Constituição para a tornar conforme com as medidas que estão no acordo mas se isso acontecer, não há legitimidade e há que sair para a rua e exigir um referendo”.

As organizações pretendem também “eliminar todas as pensões vitalícias pelo desempenho de cargos públicos” e “reduzir drasticamente todos os privilégios daí decorrentes”. O presidente da Associação 25 de Abril considera que “há lugares de representação e de responsabilidade que têm de ter as suas dignidades próprias” mas defende que Portugal precisa de deixar de viver como “novos ricos”, o que “seria altamente moralizador para a sociedade portuguesa”.

 

ND.

Lusa/fim

Agência Lusa comenta o documento da A25A e M12M sobre o “Aprofundamento da Democracia” – I

Democracia: Movimento cívico “levou cacetada muito grande” com Fernando Nobre – Vasco Lourenço (C/ÁUDIO)

 *** Serviço áudio disponível em www.lusa.pt ***

 Lisboa, 03 jun (Lusa) – A Associação 25 de Abril e o Movimento 12 de Março querem aproximar as pessoas do debate político e apelam à formação de movimentos cívicos, reconhecendo que este setor “levou uma cacetada muito grande”, depois da experiência de Fernando Nobre.

As duas associações organizaram, em abril e maio, um ciclo de debates sobre o “aprofundamento da democracia”, tendo hoje divulgado um conjunto de preocupações e de medidas para melhorar o estado democrático do país.

Em declarações à Lusa, Vasco Lourenço, presidente da Associação 25 de Abril, defende que “a manifestação e o protesto não deixam de ser necessários em muitas circunstâncias mas isso não chega: é preciso as pessoas organizarem-se em movimentos cívicos”.

No entanto, Vasco Lourenço reconhece que “o movimento cívico levou uma cacetada muito grande nas últimas presidenciais com a desilusão que houve a seguir à candidatura dos que apoiaram o doutor Fernando Nobre mas sublinhou que isso não pode levar as pessoas a desistir de participar nos movimentos cívicos”.

Fernando Nobre é agora cabeça de lista do PSD pelo círculo eleitoral de Lisboa, depois de se ter candidatado como independente nas eleições presidenciais.

No documento conjunto, as duas organizações reconhecem que “os baixos rendimentos”, a “pressão patronal”, o “aumento da precariedade laboral e o forte aumento do desemprego” constituem “inibições da participação e intervenção da população trabalhadora nas atividades cívicas e sindicais”.

 O capitão de Abril sabe que as pessoas estão desiludidas com a política e que “a desilusão leva ao afastamento”, o que faz com que “sejam sempre grupos a concentrar e definir o poder”.

Mas, argumenta, “as pessoas têm de participar, têm de lutar por aquilo em que acreditam para depois não se queixarem”.

O coronel critica ainda o funcionamento dos partidos políticos que “têm uma atuação interna muito pouco democrática e deixaram de ser escolas de formação cívica”, limitando-se “apenas à luta pelo poder”.

Por isso, defende Vasco Lourenço, “há que forçá-los a reestruturarem-se e a alterarem a sua maneira de estar”.

Na nota comum, sublinha-se que os partidos políticos “têm de deixar de estar ao serviço de interesses particulares, corporativos e financeiros, nacionais e internacionais, têm de deixar de ser pasto da corrupção”.

O presidente da Associação 25 de Abril alerta para as limitações da comunicação social, admitindo que “é impossível fugir aos donos dos órgãos de comunicação social”. Para o responsável, “é necessário criar condições para que a ela seja mais livre do que é, para que os jornalistas usem mais a liberdade que têm”.

A solução, acredita, pode passar pelas redes sociais que são “menos controladas do que os órgãos tradicionais e podem romper esse estado de coisas”.

 ND.

Lusa/fim

 

Intervenção do Presidente da A25A – Vasco Lourenço, na 1.ª sessão em 12 de Maio de 2011

ABERTURA DO CICLO DE REFLEXÕES E DEBATES “APROFUNDAMENTO DA DEMOCRACIA”

(12 DE MAIO DE 2011)

Ao olharmos para as posições defendidas por muitos dos ditos comentadores, podemos concluir que a crise nacional a que chegámos se deve, fundamentalmente, a problemas de relacionamento entre órgãos de soberania ou entre as personalidades político-partidárias que nos têm governado.

Se assim fosse, tudo se resumiria à necessidade de algumas adequações técnicas ao actual sistema político. Abrindo-se, assim, a porta ao gerar de consensos e de convergências que, segundo aquelas aparências, nos têm faltado.

Esse tipo de enfoque, cuja presença nesta sessão irá certamente ser um facto, é, na minha opinião, um enfoque parcelar, limitado, que poderá não revelar a essência do que está em jogo e que me preocupa.

Por isso gostaria de pedir aos participantes neste debate que enquadrassem as suas intervenções e eventuais propostas e sugestões para o “aprofundamento da democracia” portuguesa num cenário mais global que englobe os Objectivos dessa Democracia.

A realidade é que a Constituição Portuguesa saída do 25 de Abril não estabelece somente os mecanismos da democracia; estabelece igualmente o seu conteúdo e os seus objectivos.

Na verdade, as práticas políticas dos sucessivos órgãos de soberania e as estratégias de desenvolvimento prosseguidas no decurso deste longo período conduziram à subalternização dos conteúdos e objectivos constitucionais, substituindo-os por uma agenda neoliberal que tem dominado o mundo onde nos inserimos, contrária aos objectivos constitucionais, atendo-se somente aos mecanismos formais da democracia representativa. E, como sabemos, o conteúdo é sempre mais importante que o invólucro!…

Portugal está hoje, manifestamente, numa encruzilhada.

Um caminho possível é a continuidade do percurso neoliberal trilhado nas últimas décadas e que já conduziu à alienação da soberania nacional e irá conduzir, a breve prazo, à escravização dos portugueses e do seu Estado, pelas dívidas fomentadas pelo capital financeiro internacional com a conivência, consciente ou inconsciente, de numerosos dirigentes nacionais.

Este caminho foi possível porque, ao longo do tempo, foram sucessivamente anulados e inibidos os mecanismos e instrumentos participativos da Democracia Constitucional e a população portuguesa intoxicada por uma comunicação social subordinada aos interesses do capital financeiro, nacional e internacional, e dos políticos ao seu serviço.

Mas há um outro caminho alternativo que, rejeitando a agenda neoliberal, assenta na reconquista da soberania nacional, numa democracia fortemente participativa e cidadã e numa estratégia de desenvolvimento sustentado do país, com a subordinação do poder económico ao poder politico e a uma efectiva independência, autonomia e pluralismo dos meios de comunicação social.

Este é o caminho que continua Abril.

O primeiro caminho referido, neoliberal, irá conduzir à mais forte resistência popular, à degradação das suas condições de vida, à conflitualidade social generalizada e à tentação dos sectores dominantes por soluções políticas repressivas e autoritárias. Será aquilo a que venho chamando a “revolta dos escravos”. Não sabemos, podemos apenas imaginar, o que resultará desse processo. De qualquer maneira, o povo português devia ser poupado a mais uma conturbação dessa natureza.

Pelo contrário, o caminho de continuar Abril, o caminho da soberania, da participação cidadã e da sustentabilidade, apesar de difícil de conceber e de prosseguir na prática, contará com a confiança e a galvanização dos portugueses.

Estamos convictos de que o caminho de Abril conta com o apoio largamente maioritário do povo português. Porém, face ao actual quadro dos órgãos do Poder,esse apoio não tem forma de se expressar politicamente.

Por isso, hoje, mais do que discutir como “Aprofundar a Democracia”, talvez devessemos discutir como “Libertar a Democracia” e restituí-la ao povo soberano de Portugal. Ou, dizendo de outra maneira: para aprofundar a democracia, temos de começar por libertá-la!

Ajudem-nos a pensar como fazê-lo, no quadro da Constituição da República de Abril.

Bom trabalho

12 de Maio de 2011

Vasco Lourenço